A hora de ir embora.

O que é família para você? Nos dias de hoje, nos vemos inundados por questionamentos como esse o tempo todo, em todos os lugares. Mas não é exatamente sobre isso que eu quero falar.

Apesar de crescermos e convivermos com nossas famílias em uma casa por um longo período de  nossas vidas, acabamos tentando nos tornar uma massa homogênea formada por cada um dos integrantes. Adquirimos alguns hábitos semelhantes, determinados estilos de vida e tudo mais. Na teoria, tudo isso parece muito normal, só que na prática as coisas não funcionam bem assim.

Recebemos um determinado tipo de educação e estabelecemos algumas regras de convivência para que tudo permaneça em paz na maior parte do tempo. Só que acabamos esquecendo que, além de família, somos indivíduos. Ou seja, por mais que você tenha crescido em um determinado tipo de ambiente, com o passar do tempo, as nossas particularidades e individualidades irão se acentuar e a convivência se tornará mais difícil. É que todos nós possuímos personalidades distintas e uma forma própria de vermos as coisas da vida.

Assim como na natureza, em que a mãe pássaro empurra seus filhos para fora do ninho para que eles aprendam a voar por conta própria, mais cedo ou mais tarde chega a hora em que temos de ir embora de nossas casas também. Na maioria das vezes, os filhos se obrigam a sair de casa quando prestam vestibular em outra cidade e precisam se mudar para lá para cursar a faculdade. Isso acontece muito com pessoas de cidades do interior que se mudam para as capitais para estudar em universidades federais ou estaduais. Também vemos nos filmes as pessoas recebendo cartas de admissão de universidades do outro lado do país. Então a gente descobre que em países como os Estados Unidos, os jovens escolhem estudar bem longe de casa de propósito, para que eles possam adquirir suas próprias responsabilidades e, acima de tudo, sua liberdade.

Chega um ponto de nossas vidas em que temos mais diferenças do que semelhanças com nossos pais. Esse quadro só muda quando chegamos na idade deles e percebemos que estamos agindo de forma muito parecida (ou totalmente o oposto). Só que até que esse momento chegue, acabamos enfrentando muitas dificuldades de convivência dentro de casa. E um dos maiores desafios é aceitar que as pessoas pensam de forma diferente da nossa, têm valores diferentes dos nossos e querem coisas que nós não queremos e vice-versa.

O grande defeito dos pais é tentar moldar os filhos à sua imagem e semelhança. Eles esperam que os filhos sejam uma fotocópia autenticada deles mesmos e acabam se frustrando quando percebem que a realidade não é bem assim. E nessa tentativa infundada de tentar fazer com que os filhos sejam suas réplicas, acabam gerando atritos e desgastam sua relação com os mesmos. É bem possível pensar que isto é um comportamento narcisista dos pais porque, afinal de contas, que motivo há para quererem mini clones deles mesmos? Não entendo, mas acredito que, ao gerar um filho, eles acabam criando uma auto-confiança tão grande que acham válido multiplicar sua própria imagem por aí. Algo como “com o trabalho de apenas duas pessoas, conseguimos fabricar vidas. Então, nada mais justo do que deixarmos registrada a nossa marca!”

Então, quando tentamos preservar nossas individualidades, somos vistos como rebeldes, ingratos, mal-educados e uma porção de outras coisas. E os pais, ao invés de tentar entender o que se passa com os próprios filhos, acabam se colocando no papel de vítimas do mundo, os grandes injustiçados. É aí que é chagada a hora de nós mesmos nos chutarmos pra fora do ninho. Precisamos do nosso próprio espaço para podermos amadurecer e avaliar os mais diversos aspectos da vida sob a ótica de quem já tem uma personalidade formada e só resta saber se tudo aquilo que acreditamos ser o melhor é realmente o caminho a ser seguido.

Ter o poder de tomarmos nossas próprias decisões é algo que está constantemente sob a tentativa de alienação por parte dos pais. Eles acham que, por terem vivido muito mais do que nós, sabem o que é melhor com base apenas nas próprias experiências e não no cenário atual como um todo. Será que eles não percebem que o mundo está em constante evolução e que, a cada dia, regimes caem e teorias são comprovadas ou refutadas? O mundo de hoje não é igual ao de ontem. Então, é um grande erro tomar decisões baseado no que aconteceu no passado ao invés de pensar no reflexo dessa decisão no futuro. As maiores guerras que já foram presenciadas no mundo só aconteceram porque as nações só se importaram com elas mesmas e não com o bem-estar geral. Com certeza, se tivessem pensado nas consequências que aqueles atos ocasionariam para as próximas gerações ao invés de pensar na satisfação que proveriam para as gerações passadas, ninguém teria riscado o primeiro fósforo para começar tamanhas barbaridades.

Saindo da teoria e indo para a parte prática, nem todos os jovens têm condições de sair de casa quando é chegada a hora. Com a crise dos dias de hoje, se o jovem não tiver um bom emprego e outras pessoas com quem possam dividir as despesas de morar por conta própria, fica mais difícil de sair da casa dos pais. Ficam postergando essa decisão até que sejam financeiramente independentes e isso acaba causando cada vez mais desgaste. Outro caso pior é aquele em que a mãe sufoca tanto o filho, faz tanto por ele, que acaba o tornando um incompetente que não sabe lavar as próprias meias. Isso acontece quando as mães criam os filhos para elas mesmas e não para o mundo, como deveria ser.

Todo jovem precisa ter em mente os três P’s da independência: Preparo, Prioridades e Paciência. O preparo é fundamental, é o primeiro passo. Se você quer morar sozinho, tente ser independente dentro do seu próprio espaço. Ser responsável pelo cuidado com as próprias roupas, com os ambientes onde habita dentro da casa é tarefa primordial nessa batalha. É como fazer uma simulação da vida sozinho, só que dentro da casa dos pais. As responsabilidades são grandes e vão além de fazer faxina regularmente no quarto: a organização financeira e o planejamento habitacional são tão importantes quanto.

Ter prioridades é a base do caminho a ser percorrido. Além das metas a longo prazo, é necessário pensar na meta diária que deve ser alcançada. Estipulando pequenos trajetos que sejam fáceis de alcançar é uma boa forma de conseguir vislumbrar o que vem pela frente ao invés de dar passos no escuro. A cada novo passo dado, devem ser feitos os seguintes questionamentos: eu realmente preciso disso agora? Isso me fará diferença a longo prazo? Tomar essa decisão me colocará mais perto ou mais longe de chegar no meu objetivo?

E, por fim, mas não menos importante: ter paciência. Até que chegue a hora de voar para montar o próprio ninho em outro lugar, é importante ter paciência com aqueles que habitam a mesma casa. A capacidade de mudar e de se reinventar é muito maior no jovem do que em seus pais. Às vezes é necessário dizer “como você quiser, mãe” pra evitar brigas homéricas. A casa é dos pais, portanto, as manias e as regras que imperam por lá são deles. Respeitar as diferenças é fundamental para uma boa convivência. Mas se a parte mais teimosa não colaborar, o melhor que se tem a fazer é simplesmente ignorar e esperar passar.

 

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