Pode parecer que esse é o texto mais triste do blog, mas não é. Ele conta uma história triste. Mas ele também fala da reviravolta que aconteceu em uma vida.
Se pararmos para pensar, todos nós temos ‘questões’ a serem resolvidas. Uso o termo ‘questões’ ao invés de ‘problemas’ porque tudo depende do seu ponto de vista. Podemos encarar todas essas questões de várias formas: de um simples obstáculo ou desafio a ser enfrentado até um problemão sem previsão de resolução. A intensidade e o quanto isto nos afeta é que vai definir o nome que daremos a esse monstrinho.
Eu, por exemplo, sempre fui a rainha do drama e via qualquer coisinha como um grande problema sem fim. Tinha medo de resolver as coisas mais banais. Até o dia em que resolvi colocar essas palavras que vocês estão lendo no papel: hoje. Foi uma coisa tão especial que aconteceu que é simplesmente impossível não compartilhar. Gostaria que todo mundo pudesse sentir isso. Parece que eu abri uma janela em frente aos meus olhos. Coisa mais esquisita, eu confesso, porém fascinante.
Não chore por um problema que não é seu.
Difícil de entender logo de cara, né? Não estou dizendo que é pra você não se compadecer quando ouve falar de uma tragédia ou das crianças que estão sem família com a guerra que está acontecendo. Nada disso. Estou falando de você, das coisas que acontecem com você e que lhe fazem chorar. As coisas externas que chegam na hora menos esperada e que parecem fazer seu mundo desabar. Bem, vou explicar.
Aquela fase que vai do início da adolescência até a pré-vida-adulta é cheia das complicações. No meio disso tudo, certa vez, eu entrei em depressão. Motivo: decepção. Ou melhor, decepções repetitivas que nunca prezaram pelas segundas chances que a vida deu. Às vezes a gente acha que está cercada pelas melhores pessoas do mundo, amigos que chegam a ser como irmãos, aquela coisa toda. Até que eles pisam na bola com você. Na opinião dessas pessoas, elas podem ter feito nada demais, mas isso realmente te magoou. O tempo passa e você reavalia a situação e dá uma segunda chance (com aquele pensamento “melhor aceitar as falhas e imperfeições do outro do que ficar sozinho, afinal, todo mundo erra nessa vida”). Aí todo mundo chora, se abraça, se perdoa. Passa mais um tempo e essas mesmas pessoas pisam na bola contigo de novo. Por algum motivo que, de tão ridículo, você nem consegue entender direito.
O primeiro pensamento que passou pela sua cabeça é o de que você está exagerando. Ou pior: que você é a pessoa que está errada. Mas aí você liga os pontos e vê que sempre tentou fazer tudo certo, ser legal e, principalmente, justa com todo mundo. Então se dá conta de que aquelas pessoas que você tanto amava e idolatrava foram, naquele momento, uns grandes babacas.
Cena seguinte: você se tranca no quarto e chora até secar toda a água do corpo e encher dois baldes. Pensamentos do tipo “Como fui me enganar tanto?”, “Será que eles sempre foram assim?”, “Por que isso só acontece comigo?” são recorrentes na sua mente. Os choros também são recorrentes. Dores de cabeça em função do choro. Falta de apetite em função da dor de cabeça. Fraqueza corporal e mental. Baixa da auto-estima. Perda total da auto-confiança, vontade de sumir do mapa. Algo simplesmente mexeu tanto com a sua cabeça que parece que seu cérebro não funciona da mesma forma. Parabéns, você começou a entrar em depressão. E isso aí é uma porcaria.
Não é uma coisa que vem sozinha. Nesse caso, o seu trauma foi tão grande que desligou o botão no seu cérebro que te dizia que o mundo era bom. Cena seguinte: crises, muitas crises. Tendências suicidas. Um baque para toda a sua família. O seu namoro acaba. Sua mãe não te deixa mais sozinho em casa. O tempo passa, você aceita que precisa de terapia. Acompanhamento físico e mental. Remédios tarja preta. Excesso de remédios tomados. Um litro de soro na veia. Sonolência. Baixo desempenho no trabalho/escola/faculdade. Mais terapia. O tempo passa. Você está livre. Interrompe o tratamento (dessa vez, com ajuda médica, pra evitar outras crises que faziam sua família entrar em pânico).
Próxima cena: você reconstitui sua vida, muda de emprego, conhece alguém legal e parece que as coisas começaram a engrenar novamente. Mas a maldita depressão adora dar as caras quando não é chamada. Outros motivos surgem. Mas peraí, não vamos dar continuidade nisso. Sabe por quê? Porque tudo isso poderia ter sido evitado. Sim!
Eu deveria ter pensado lá atrás que, se aquelas pessoas foram babacas comigo e isso era tudo o que elas realmente eram, o problema é todo delas e não meu! Elas são assim e continuam, inevitavelmente, a agir assim com outras pessoas. Acabam magoando quem está em volta e todo mundo acaba se afastando delas. Meu erro? Não mesmo. A Lei do Retorno aqui se aplica tanto se você levar para o lado espiritual ou prático. É ação e reação. O lado espiritual diz que você vai colher aquilo que plantar. O lado prático vai te mostrar que se você for um babaca com quem te quer bem, vai acabar sozinho. Se puxar o tapete de todo mundo no trabalho, um dia vão puxar o seu e assim por diante. O mesmo serve para o seu sofrimento: se você só plantar chororô, vai colher uma depressão muito chatinha que será uma pedra no seu sapato. Você quer isso? Não, né?
Isso faz parte das coisas que acontecem com todo mundo. Você pode ter descoberto que o seu namorado ou namorada não tem aquela retidão de caráter que você esperava. Ou descobriu que alguém da sua família faz um monte de tretas por aí e passa a perna em todo mundo. Ou que alguém do seu trabalho usa as ideias dos outros pra se promover. O que você vai fazer? Chorar? Não vai. O problema é delas e quem terá as consequências disso tudo são elas! Adianta derramar uma lágrima sequer? Não adianta, você sabe que eu já testei.
Quem me conhece, sabe que a sexta-feira de Páscoa é uma data especial para mim. Em 2010, minha mãe e eu tivemos um acidente feio de carro. Ela dormiu no volante e capotamos. É uma sensação horrível ver tudo em volta rodar, o barulho da lataria amassando, o brilho seco das faíscas vindas do carro sendo arrastado pela pista por metros. Tudo o que você consegue fazer é gritar, se encolher para se proteger e esperar o carro parar sem bater em nada. E o pior de tudo é o silêncio que fica quando tudo para. Você olha para a pessoa que está com você e ela está com o rosto virado para o outro lado, sem gritar, sem dizer nada. A demora na resposta quando você chama. Você grita e tudo só se acalma quando você ouve “Tá tudo bem, filha?”. O resto é resto. Nesse dia eu renasci. Minha mãe também.
Passados 5 anos, nessa sexta-feira de Páscoa eu me encontrei chorando no quarto em decorrência de turbulências familiares. Visitas estavam para chegar para o almoço e eu ia fingir que estava doente e ficar o dia inteiro deitada na cama. Foi aí que eu sentei no chão do quarto, olhei para a minha mini estátua de Krishna (sim, eu tenho inúmeras crenças, outro dia conto melhor), acendi um incenso de sândalo e pedi que ele me ajudasse a passar por esse momento tão difícil. Fiquei olhando para a fumaça branca que contrastava com a madeira escura do meu armário. Fui me acalmando e, nesse momento, me surgiu o seguinte pensamento: “Não chora, não perde teu tempo com um problema que não é teu. Constrói o teu presente e futuro bem diferente daquilo que te faz chorar.”
Então eu levantei de onde estava, fui tomar um banho para relaxar e fui receber as visitas que estavam chegando. Quando a gente passa a ter a dimensão do poder de decidirmos o rumo de nossas próprias vidas, fica tudo mais fácil. E aquilo que antes parecia um problema, agora passa a não ser mais meu.
TRILHA SONORA:
Victory Lap – Macklemore & Ryan Lewis
“Don’t forget where you come from
Don’t die holding on to your words
Cause you know you got a whole world to change
But understand who you got to change first”